terça-feira, 17 de agosto de 2010


Minha condição humana me fascina.Conheço o limite de minha existência e ignoro por que estou nesta terra,mas às vezes o pressinto.Pela experiência cotidiana,concreta e intuitiva,eu me descubro vivo para alguns homens,porque o sorriso e a felicidade deles me condicionam inteiramente,mas ainda para outros que,por acaso,descobri terem emoções semelhantes às minhas.
E cada dia,milhares de vezes,sinto minha vida — corpo e alma — integralmente tributária do trabalho dos vivos e dos mortos.Gostaria de dar tanto quanto recebo e não paro de receber.Mas depois experimento o sentimento satisfeito de minha solidão e quase demonstro má consciência ao exigir ainda alguma coisa de outrem.Vejo os homens se diferenciarem pelas classes sociais e sei que nada as justifica a não ser pela violência.Sonho ser acessível e desejável para todos uma vida simples e natural,de corpo e de espírito.
Recuso-me a crer na liberdade e neste conceito filosófico.Eu não sou livre,e sim às vezes constrangido por pressões estranhas a mim,outras vezes por convicções íntimas.Ainda jovem,fiquei impressionado pela máxima de Schopenhauer:“O homem pode,é certo,fazer o que quer,mas não pode querer o que quer”;e hoje,diante do espetáculo aterrador das injustiças humanas,esta moral me tranquiliza e me educa.Aprendo a tolerar aquilo que me faz sofrer.Suporto então melhor meu sentimento de responsabilidade.Ele já não me esmaga e deixo de me levar,a mim ou aos outros,a sério demais.Vejo então o mundo com bom humor.Não posso me preocupar com o sentido ou a finalidade de minha existência,nem da dos outros,porque,do ponto de vista estritamente objetivo,é absurdo.E no entanto,como homem,alguns ideais dirigem minhas ações e orientam meus juízos.Porque jamais considerei o prazer e a felicidade como um fim em si e deixo este tipo de satisfação aos indivíduos reduzidos a instintos de grupo.
Em compensação,foram ideais que suscitaram meus esforços e me permitiram viver.Chamam-se o bem,a beleza,a verdade.Se não me identifico com outras sensibilidades semelhantes à minha e se não me obstino incansavelmente em perseguir este ideal eternamente inacessível na arte e na ciência, a vida perde todo o sentido para mim.Ora,a humanidade se apaixona por finalidades irrisórias que têm por nome a riqueza,a glória,o luxo.Desde moço já as desprezava.Tenho forte amor pela justiça,pelo compromisso social.Mas com muita dificuldade me integro com os homens e em suas comunidades.Não lhes sinto a falta porque sou profundamente um solitário.Sinto-me realmente ligado ao Estado,à pátria,a meus amigos,a minha família no sentido completo do termo.Mas meu coração experimenta,diante desses laços,curioso sentimento de estranheza,de afastamento e a idade vem acentuando ainda mais essa distância.Conheço com lucidez e sem prevenção as fronteiras da comunicação e da harmonia entre mim e os outros homens.
Com isso perdi algo da ingenuidade ou da inocência,mas ganhei minha independência.Já não mais firmo uma opinião,um hábito ou um julgamento sobre outra pessoa.Testei o homem.É inconsistente.

Albert Einstein, in “Como Vejo O Mundo”

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