quinta-feira, 9 de abril de 2009

um dia de cão...

Li essa matéria e decidi que tinha que postar aqui!Leiam,please,e comentem!
A foto é do pobre cão abandonado que um "artista" matou de fome no seu "ato heróico e artisto!" (Afffffff!!)
Au revoir




A idéia era viver um dia em um abrigo para animais abandonados, como se eu fosse um cachorro, comendo ração, dormindo no chão e fazendo xixi no jornal. Eu queria me sentir na pele de um vira-lata que, junto com outros bichinhos, aguarda uma boa alma que por fim o livre da vida de desgarrado. O que parecia simples de arranjar, entretanto, se revelou bastante complicado. Parece que este tipo de estabelecimento não nutre um bom relacionamento com a imprensa em geral. A simples menção da minha proposta fechou diversas portas, no Rio Grande do Sul e em São Paulo. Nem mesmo as indicações de tratadores, veterinários ou militantes dos direitos dos animais ajudaram.


Depois de algumas tentativas, eu estava por desistir. Mas acabei conseguindo o telefone de uma senhora que mantém um abrigo informal em sua casa, na região metropolitana de Porto Alegre. Ela simpatizou com a iniciativa e concordou em participar, desde que se lhe resguardasse nome e endereço. E eu, que esperava dormir em um Centro de Controle de Zoonoses imoral, acabei tendo de me contentar com um pequeno abrigo de uma caridosa senhora de meia-idade.


Os cães, ao contrário do que eu supunha, ficam todos juntos, na mesma área cercada. Para mim, que esperava dormir em uma jaula particular, ver mais de dez animais juntos, compartilhando comida e banheiro, foi preocupante. Eu tinha medo do que poderia acontecer durante a noite. Tinha medo de ser mordido e me sentia desconfortável em ter de comer na mesma tigela que o restante da matilha.


A solução foi ficar na quarentena, um pequeno cercado de cerca de cinco ou seis metros quadrados. Meu companheiro seria Zézim, o vira-lata recém chegado. Zézim tem uma doença genética. Não há um só pelo em todo seu corpo e ele se move muito pouco e com dificuldade. Não latiu nenhuma vez enquanto estive com ele. Havia dois dias que estava ali e ficaria isolado por pelo menos mais uma semana.


Entrei em uma sexta-feira no fim da tarde, por decisão da minha anfitriã. Zézim me olhou e depois caminhou devagar em minha direção. A quarentena, ao contrário do cercado principal, tem uma grade na parte de cima, o que me obrigava a sentar com as costas inclinadas ou deitar sobre o cimento. Ao contrário de mim, Zézim tinha duas almofadas e alguns cobertores. A coisa estava indo bem até perto das 23hs, quando minha bexiga começou a dar sinal de vida.


Urinar em uma jaula com 70 centímetros de altura pode ser bem desconfortável. É difícil encontrar uma posição de aconchego. A disposição de nosso jornal, muito próximo a uma das grades, complicava ainda mais a situação. Eu teria de urinar deitado de lado. Parecia impossível sair seco dessa. Então decidi puxar o jornal para o meio do cercado, apesar de ele já estar encharcado com o xixi do Zézim. Por fim consegui fazer o que tinha de fazer. Apenas pedi a Deus que eu não tivesse nenhuma necessidade de outra natureza no decorrer da noite e do dia subsequente.


Zézim dormiu a noite toda. Durante a madrugada, eu encostei a cabeça sobre a almofada onde ele estava. Ele acordou, fez alguns ruídos agudos, chegou mais perto do meu rosto e voltou a dormir. Parecia feliz.


Dormi cerca de duas horas, talvez um pouco mais. Quando acordei, minha coluna e meu ombro direito doíam. Pela primeira vez o cheiro forte, ao qual eu pensei me acostumar, começou a incomodar. Eu não estava com muita fome, mas resolvi que, se eu chegara até ali, tinha de comer a ração da tigela.


Para a minha surpresa, o gosto não era de todo ruim. Parecia osso de galinha ou hambúrguer cozido demais. A consistência não é macia como nos comerciais da televisão. Pelo contrário. É seco e farelento. Comi algumas bolotas, imagino que a mesma quantidade que um cão comeria pela manhã.


Antes do meio-dia a senhora apareceu, me oferecendo leite e um pão com queijo branco e margarina. Heroicamente, não aceitei. Se eu sentisse fome de verdade, deveria comer a mesma ração que alimentava Zézim. Ironicamente, depois da minha recusa, ela tirou o queijo do pão e ofereceu a ele, que se deliciou com o presente.


O resto da cachorrada latiu e brincou durante toda a tarde, no cercado maior. Àquela altura, Zézim e eu éramos quase íntimos e já havíamos brincado mais de uma vez. As duas últimas horas foram divertidas. Eu não sentia mais dor nenhuma e Zézim ficou bem ativo, apesar da dificuldade em se locomover. Foi o único momento em que eu acreditei ter me sentido de fato como um cachorro. Não um cachorro doente ou um cachorro abandonado. Apenas um cachorro. Não pensei na comida, nem no banheiro, nem em nada. Não pensei no texto que teria de escrever depois. Com a cabeça vazia, apenas brinquei com Zézim. Então entendi que para ele - bem como para todos os outros cães ali - bastava estar vivo, ser bem tratado e ter alguém com quem brincar. Ao adotar um animal abandonado, talvez você aprenda lições valiosas sobre a sua própria vida e sobre o mundo. Não é preciso nenhuma mágica. Basta um bom coração e a disposição para esvaziar a cabeça e se entregar ao prazer de ter um amigo como Zézim.

Por Cristiano Baldi, especial para o Yahoo! Brasil

Um comentário:

Meri disse...

Poxa! Que coragem desse homem, hen? Uma experiência além da imaginação!